07 novembro 2006

Maravilhoso Portugal, maravilhoso!

Imagem: "Mais vale dormir...", Daniel Camacho
«Os portugueses vão poder escolher as sete maravilhas nacionais». Fiquei estarrecido e ao mesmo tempo com uma tremenda vontade de rir, ao ler esta frase na abertura de uma notícia do "Correio da Manhã" de hoje. Dá vontade de dizer que parece que a Europa sacudiu a cauda, fomos projectados para o espaço e vivemos noutro planeta!!
Primeiro, a RTP lembra-se de eleger os grandes portugueses, agora são as sete maravilhas nacionais!... «Quão oportuno», pensei. Qualquer dia, lembram-se de pôr em votação, via chamadas de valor acrescentado, se preferimos o permanente aumento de impostos, o desaparecimento das reformas ou o suicídio colectivo!!
Apressei-me a reflectir sobre o assunto e, como bom português que sou, rapidamente me vieram à cabeça, em catadupa, incontáveis lusitanas maravilhas! O problema é que não me conseguia decidir por sete. Talvez por ansiedade. Era este o momento tão ansiado para nós, portugueses de ginjeira, expressarmos o quão estamos satisfeitos com a conjuntura actual… e com todas as outras. Enchemo-nos de gana e lá vai: aumento do desemprego, diminuição do poder de compra, saúde insana, ensino mal educado, segurança social insegura, má gestão, corrupção, aumento da criminalidade, empobrecimento… ‘Pera lá, sete maravilhas é muito pouco, maaaau!…
Diriam, os de fora, que as nossas sete maravilhas serão o Figo, as praias quentinhas, o Vinho do Porto, a Amália, a proeminente unha do mindinho, a nossa cerveja e o farto buço das nazarenas (com todo o respeito para com as ditas).
Em boa verdade, nós somos um povo maravilhoso, com uma maravilhosa capacidade, que poucos países terão (e que tanto jeito dava, por exemplo, aos americanos e outros que tais!), de autocrítica pela negativa!!! Uma capacidade que chega a raiar o pessimismo, com tanto de entristecedor quanto de realístico!...
Já a sequência dos nossos últimos governos merecem ser isolados e analisados de per si. Aliás, eles próprios constituem, no seu conjunto, uma autêntica maravilha. A maravilha do optimismo. A capacidade de enfiarem a cabeça nas areias movediças onde o país se vai afundando! A maravilha de pensarem que sabem sempre o que é melhor para o país, não referendando (nem que fosse via SMS!) questões decisivas, que têm constituído a certidão de óbito da nossa economia.
Mas não… que estou eu a dizer? Vamos lá escolher as sete maravilhas e os não-sei-quantos grandes portugueses; vamos lá exorcizar o pessimismo que nos assombra, e que degenerou em depressão profunda, algures entre a mudança da moeda e a Guerra do Iraque; para não perdermos o comboio ou, porque não, o TGV, enfim, para não chumbarmos na disciplina de “dinheiros comunitários”, tapados que estamos por faltas!
A primeira maravilha poderá ser… a de escondermos, apressadamente, a caca por debaixo do tapete, para receber condignamente os grandes acontecimentos… a segunda maravilha, talvez, a habilidade circense de, em altura de cataclismos naturais ou de ataques terroristas noutras partes do mundo, o nosso Deus passar, num impulso, de padrasto para pai todo-misericordioso por nos reservar o cantinho do céu… na Terra! Afinal, fomos ou não fomos nós que descobrimos e evangelizámos, pelo menos, meio-mundo? Dai-nos descanso, por Deus, e deixem-nos escolher as nossas sete maravilhas… sossegados!

Sem comentários: